segunda-feira, 28 de julho de 2014

"- Passou! Foi só um susto! Você está bem e não feriu ninguém!"

São algumas das frases que ouço após sofrer um novo acidente por conta de uma crise hipoglicêmica severa ao volante. Desta vez, acho que foi mais rápido o processo de queda da glicemia pois o percurso que dirigi foi muito curto. Felizmente só fiquei com prejuízos materiais. Só que não. Fiquei com prejuízos internos incalculáveis. Ainda estou levantando as perdas. A da confiança em mim mesma é a maior perda. Saber que não posso mais contar comigo para me proteger é um desespero, uma angustia. Amigos diabéticos recomendaram não desistir de dirigir mas...é no que penso dia e noite.
Tudo aconteceu na última sexta-feira, dia 25. Eu estava saindo do salão de beleza onde tinha feito as unhas da mão e seguiria em direção ao colégio do meu filho. Quando entrei no carro, peguei o celular e liguei para minha filha que estava em casa. Perguntei se o André havia chegado em casa. Ela suspeitou que eu não estivesse bem. "- Mãe você está passando mal?" A essa pergunta, muitos diabéticos metidos como eu, que pensam que sabem se cuidar como deveriam, responderiam sem hesitar: "- Não. Estou bem. Vou pegar ele e já chego em casa." Foi isso que fiz, porém já em estado letárgico e desliguei o telefone. Não coloquei o cinto, provavelmente para não estragar as unhas que ainda não estavam secas. Cruzei a pista e peguei o sentido para o colégio. De lá para cá, não me recordo de muita coisa. Lembro de ter dificuldade de manter a atenção na pista. Fiquei tentando me fixar no meio fio e seguir por instinto até...meu destino. No trajeto eu contornei uma praça e segui já bastante desorientada. Um outro motorista percebeu que algo acontecia e me seguiu tentando me chamar a atenção. Segundo ele, eu já estava encurvada por sobre o banco do carona como se procurasse algo no chão do veículo. Creio que desmaiei. O carro perdeu a direção, bateu primeiro no meio fio e depois na traseira de um veículo que estava estacionado em frente a um supermercado do bairro. Acordei com dor na cabeça, vi o vidro da frente do carro rachado e pensei "- Que merda eu fiz desta vez?". 

Um homem começou a me ajudar. Eu disse que era diabética. Ele logo supôs que eu estava com hipoglicemia e começou a me dar sachês de açúcar cristal, paçoca, biscoitos recheados. Eu ia comendo sem pensar. Depois estiquei a mão e peguei meu monitor. Automaticamente consegui fazer o teste, ainda sem estar totalmente consciente e o resultado foi 35. Já fiquei com menos do que isso sem ter estado tão mal quanto desta vez. O corpo vai ficando cada vez mais ardiloso com o passar do tempo. Minha última refeição tinha sido um almoço leve às 12:15. Tomei 2 unidades de humalog para corrigir os 150 que deu antes do almoço. Eu faria 3 horas de intervalo entre as refeições exatamente naquele momento da batida. Meu plano era lanchar após pegar meu filho no colégio. Não deu tempo.
Fui socorrida por uma ambulância do Corpo de Bombeiros, me colocaram no soro glicosado e mediram novamente (resultado 37) e fui  levada para um hospital público para checar se houve algum trauma na cabeça.
Fiz a tomografia na cabeça e o resultado não revelou nenhum problema aparente. Fui liberada do hospital. E agora? Como continuar com a vida que tinha antes? Cinco anos após meu último incidente grave de hipoglicemia quando quebrei o tornozelo, um novo susto destrói minha confiança. Não sei se posso mais confiar em mim mesma. E isso me consome. Estou tentando listar algumas medidas importantes para me ajudar para que isso não se repita. Até agora, são estas:
- colocar um adesivo no painel do carro com os dizeres: ANTES DE DIRIGIR, MEÇA SUA GLICEMIA!)
- Prender a chave do carro ao meu aparelho de glicemia. Será um trambolho tão grande que não tem como eu ignorar este aviso.
- Andar de carro somente com acompanhante. Nunca sozinho. Meus filhos não podem ser considerados acompanhantes.
- Ter um cartão grande informando minha condição dentro da bolsa. Vou providenciar isso.
- Manter estoque de produtos para me recuperar de hipo dentro do carro e na bolsa com informação clara para que estranhos saibam o que fazer. Por mais que eu soubesse sobre isso....não estava fazendo.
- Orientei a minha filha a lidar comigo na situação pois ela percebeu o que estava acontecendo mas estávamos ao telefone. A ideia é que ela comece a falar comigo com comandos mais fortes do tipo: "- Mãe, se vc não ligou o carro ainda, tire a mão da chave do carro, saia do carro, procure alguém aí perto e passe o telefone para esta pessoa que preciso falar uma coisa." e daí por diante. Fazer com que ela assuma o controle já que eu posso já estar muito mal, sem qualquer raciocínio. Comandos diretos. Talvez eu obedeça.

E, por último, se o medo for mais forte do que a coragem:

- NÃO PEGAR MAIS NO VOLANTE!

Um beijos em todos!

Um comentário:

Diabetes sem neuras... disse...

Adorei sua história!!!
Não me sinto mais sozinha nas minhas histórias com o carro.....
Tive uma ocorrência grave, quando andei 500 mts. Na contramão, quase derrubei uma moto. Desacordei na entrada de balsas de Vicente de Carvalho-Guarujá.
Fui trazida para casa por um policial....pq tive a reação de digitar o número do celular do meu marido, passá-lo para o guarda, ingeri três pastilhas de glicose e dormi no banco do passageiro.....
Só não perdi a carteira de motorista porque ele já havia saído do serviço e estava indo para casa.
Fora as vezes que parei em cima de calçadas de padarias e entrei roubando saches de açúcar e colocando tudo na boca.....
Hoje sou muito consciente nestas situações pois a primeira parada na padaria minhas filhas ficaram dormindo, atadas aos cadeirões do carro enquanto eu resolvia a hipoglicemia.
Meu maior medo é de matar alguém, matar minhas filhas ou perde a carteira de motorista.